Finalmente, uma solução para os cruzeiros em Veneza

A relação de Veneza com os grandes cruzeiros não é das melhores. E isso não é de hoje; há pelo menos uma década, a população da cidade pressiona o governo local para proibir esses navios gigantescos de aportarem ali.

Eles costumam chegar à cidade pela Lagoa, com acesso direto à parte histórica – e turística – de Veneza. Com isso, desembarcam milhares de novos turistas todos os dias na cidade, que já sofre com o excesso de turistas que chegam por terra ou de avião.

Os impactos do overtourism em Veneza são bem claros na sociedade veneziana, com o alto custo de vida puxado pelos 30 milhões de turistas anuais forçando os moradores a saírem de suas casas no centro histórico. Desde a II Guerra Mundial, há cerca de 75 anos, a população caiu de 175 mil para 50 mil residentes.

Mas o impacto vai além do que é visível. Veneza é uma cidade única e delicada, com estruturas milenares, construídas sobre porções aterradas da lagoa. Sua própria localização já a torna vítima de desgastes causados pela água; um exemplo é durante os períodos de acqua alta, quando a lagoa invade a cidade e causa grandes inundações.

A acqua alta causa danos a Veneza, mas é um fenômeno natural – cada vez mais intensificado pelo aquecimento global, mas isso é assunto para outro post. Já os danos trazidos pelos cruzeiros são mais graves e urgentes, e são o motivo pelo qual os moradores protestam tanto contra eles.

Cruzeiros são ruins para Veneza?

O primeiro ponto negativo é que a enorme quantidade de turistas que chegam de navio, além de contribuírem para a superlotação da cidade, não causam um grande impacto na economia, pois ficam apenas um dia (de fato, apenas 20% dos turistas que visitam Veneza ficam mais de um dia; mea culpa: eu mesma nunca dormi lá).

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Depois, o impacto cultural desses navios enormes, que aparecem como gigantes entre as paisagens venezianas e – sem exagero – estragam a vista. Não é apenas uma questão de “vai sair feio na foto”; até a classificação de Veneza como Patrimônio Mundial da Unesco está em perigo por conta dos cruzeiros aparecendo na Piazza San Marco.

Cê nem tinha que tá aqui, linda!

Além de tudo isso, outro problema grave causado pelos cruzeiros é ambiental. Os gases emitidos pela queima de combustível dos cruzeiros – imagine de quanto combustível estamos falando – são altamente poluentes, com resíduos que permanecem na cidade depois que eles vão embora e são espalhados pelo vento. Para se ter uma ideia, um estudo de 2017 mostra que os 203 cruzeiros que passaram pela Europa naquele ano poluíram mais o ar que os 260 milhões de carros que circularam na União Europeia no mesmo período. Há também estudos sobre a poluição das águas causadas pelos navios desse tipo, com derramamentos de esgoto e óleo.

Um dos muitíssimos protestos contra os cruzeiros em Veneza

No caso particular de Veneza, que foi literalmente construída sobre solo aterrado, o deslocamento de água causado pelos cruzeiros acelera a erosão das estruturas milenares que mantêm a cidade em pé.

Esses navios também causam alterações no fundo da lagoa e dos canais e, consequentemente, mais impacto ambiental: por exemplo, prejudicam o ecossistema ao acabar com bancos de areia que servem de lar para vários animais, além da intensificarem a acqua alta, já que há mais água nos canais da cidade (para se ter uma ideia, há menos de um século, a profundidade média da lagoa era de 40cm; hoje, é de 1,2m).

E, por fim, há o risco de colisões e acidentes graves. Só neste ano, dois episódios fizeram todo mundo arregalar o olho – e prestar mais atenção na questão dos cruzeiros em Veneza.

O primeiro, em junho, mostra um navio colidindo no porto e acertando uma embarcação menor. É, sinceramente, desesperador:

O segundo, em julho, mostra um cruzeiro quase acertando um navio menor durante uma tempestade. Mas, para mim, o pior é vê-lo tão perto de onde as pessoas passam:

O futuro dos cruzeiros em Veneza

Esses dois últimos acontecimentos parecem ter sido a gota d’água e, depois de uma década de indecisões, finalmente há alguma resolução vinda do governo para diminuir e controlar o impacto dos cruzeiros em Veneza.

Instalação do Banksy criticando os cruzeiros durante a Bienal de Veneza deste ano…

A ideia do Ministro dos Transportes da Itália é que, a partir de setembro deste ano, os que pesarem mais de mil toneladas atraquem em portos afastados do centro histórico, como Fusina e Lombardia. A expectativa é que, até 2020, um terço das embarcações que chegam a Veneza sejam direcionadas para eles.

Uma outra medida anunciada, feita para os turistas que chegam de cruzeiro, é a cobrança de 10 euros para os que estão em excursões e não dormirão na cidade. Essa taxa é uma forma de minimizar os impactos negativos do overtourism causado por esses navios.

…E, na de 2017, a obra “Stop the Madness”, de Philip Colbert, falando dos cruzeiros e do overtourism destruindo a cidade

Essas propostas não foram aprovadas, mas sua existência é prova de que as autoridades italianas estão, finalmente, avaliando alternativas para os cruzeiros que chegam no coração de Veneza.

Em todo caso, agora que você sabe que o “luxo” e o “conforto” dos cruzeiros tem um preço bem mais alto do que o que seu bolso sente, minha recomendação é evitá-los – e não só para Veneza. Tem maneiras bem mais interessantes, responsáveis e menos agressivas de conhecer os lugares dos seus sonhos 😉

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Giovana Penatti

Giovana Penatti

Giovana mal pode esperar pela terça-feira à tarde na qual estará tomando um drink numa praia no Mar Mediterrâneo rindo muito de tudo isso. Enquanto isso, escreve sobre viagem e morar no exterior por aqui!